quarta-feira, 16 de outubro de 2013

12. Crônica: Entrevista de emprego

(por Raquel Lisboa)


mãe vovó

Tudo começou no momento em que me encontrava em frente ao PC, fazendo algo muito importante, ou seja, acessando o face, quando o telefone tocou. Tratava-se de uma moça solicitando o meu comparecimento em uma agência de empregos no dia seguinte. Pensei:
” Justo agora que eu estava me acostumando a ficar desempregada...”

Como de costume, no outro dia levantei atrasada. Eu sabia que precisava fazer alguma coisa, mas não me lembrava exatamente o que era. “Bem... Levar o lixo na rua, acessar o face, terminar a leitura do livro de Truman Capote, acessar o face, ir à feira, acessar o face, fazer resenha, acessar o face... Putz!!!! A entrevista!!!”

Aprontei-me rapidamente. Eu precisava estar no local às 13:30 e saí de casa às 12:55. Na saída do portão de casa, olhei com certa tristeza o ônibus que eu ia pegar passando... Não tinha jeito, teria de ir a pé mesmo!

Cortei caminho para ganhar tempo. Fazia um calor de quarenta graus e, não sei quanto a você, mas quando estou atrasada e enrolada para fazer qualquer coisa, imprevistos é o que mais acontecem. Por exemplo, além da minha meia calça desfiar por inteiro e eu pisar num cocô de cachorro, encontrei TODOS os conhecidos no trajeto. 

Parece que todo mundo que eu conhecia perdeu o ônibus, só que no sentido contrário, ou seja, eu ia  ao centro da cidade e eles voltavam de lá.
Quando  encontramos pessoas que a muito tempo não víamos, já viu, né? Delicadamente escapei da maioria sem qualquer inconveniência, sempre demonstrando que estava apressada, mas com muita polidez. 

Até que eu encontrei a Dona Cida... Ai, meu Deus! Um ano tem 365 dias e justamente naquele eu haveria de encontrá-la? A Dona Cida é uma senhora que quando eu tinha cinco anos já era velha. Hoje eu tenho 31 anos e ela continua do mesmo jeito. 

Então... O caso é que, por ela ser bem avançada na idade, aposentada e sozinha, quando encontra alguém na rua... Difícil se livrar dela. Eu tenho paciência, porque sei que um dia não muito distante, também serei idosa. Mas... Justo naquele dia?

Fingi que não a vi. Ela me gritou do outro lado da rua: “ Raquelzinhaaaaa!”
Tive que olhar.
Ela perguntou: “ Como você está?”
Eu respondi morrendo de pressa: “ Bem...”

Eu sabia que se devolvesse a pergunta educadamente: “ E a senhora (está bem)”?
Ela responderia: “ Não minha filha... Estou com uma dor que vem das pontas dos pés até a nuca... Já fui ao médico ele disse que...”, porque isso já aconteceu antes.
Então, resolvi ser mais objetiva:

“Estou bem Dona Cida. Até mais!” E segui andando.
Daí, a Dona Cida lembrou-se que precisava voltar para o centro da cidade e aproveitou a minha companhia, naqueles passos lentos, fazendo as perguntas de sempre:
“ Como está a  sua mãe? “

Respondi, tentando apressar os passos: “Bem.”
Quando consegui me afastar, ela prosseguiu em voz alta, quase gritando:
 “Soube que a sua mãe casou novamente...”

A minha mãe se casou pela segunda vez há cinco anos e a Dona Cida sabe muito bem disso!
Respondi a pergunta com um sorriso apenas e quase correndo  consegui escapar da falastrona.
Cheguei ao local da entrevista às 13:28 e estava linda de morrer: suada, meia desfiada e limpando o restinho de cocô de cachorro que grudou no sapato.
Ainda assim, depois de tanto sufoco, a vaga foi minha! Talvez pelo fato de eu ter sido a única candidata a participar da seleção.

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Imagem retirada de: http://br.freepik.com/fotos-gratis/mae-vovo_571664.htm


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